sexta-feira, 31 de maio de 2013

Esthela




Esthela é minha prima esquizofrênica. Na verdade retardada (mas isso eu só entendi quando fiquei um pouco mais velho,pois todos me diziam ''esquizofrênica''). Esthela aparecia pouco em publico, naquela época eu pensava que seus pais tinham vergonha da própria filha. Hoje tenho certeza.
Só me lembro dela em festas de família ou em velórios (que é na verdade um outro nome para ''festas de família'').
Sempre que eu olhava para ela nos famigerados encontros, Esthela estava lá no canto,sozinha,sorrindo e babando. Esthela realmente parecia se diverti naquelas festas de fim de ano,parecia , alias, que era a única que se divertia.Rindo sozinha a noite toda.Rindo sem parar um minuto sequer do quão ridículo aquilo tudo era.
Quando eu era criança me incomodava com a sua presença, não porque a moça estava sempre sorrindo e babando ao mesmo tempo, mas sim por ela estar sempre sozinha.Parada, largada no canto. E mesmo assim, sorrindo.
Eu não entendia aquele sorriso.
A última vez que vi minha prima Esthela, eu devia ter uns 8 anos de idade. Foi em uma noite de natal. Esthela continuava a mesma. Sozinha. Nos cantos.Todos riam, comiam, falavam alto ,tudo isso fazendo extrema questão de que suas bocas estivessem bem cheias de qualquer alimento, o que era (chester ou farofa) pouco importava. O que importava mesmo era a boca estar bem cheia na hora exata do desfecho da piada de seu tio distante que mora no interior.Acho que não é todo dia que se tem a oportunidade de cuspir comida em algum parente. Todos ali aproveitavam ao extremo a ocasião. Cuspiam uns nos outros o máximo que podiam.Rindo.
Esthela nunca saia dali ,daquele canto onde sempre a deixavam todos os anos, na noite do dia 25 de dezembro. Parada na mesma posição a noite toda. Sorrindo delicadamente. Era sem duvidas a mais educada das pessoas naquela enfadonha reunião.
Depois daquela noite nunca mais a vi. Um dia quando eu tinha uns 16 anos, alguém me contou que Esthela estava grávida. Fiquei imaginando como alguém poderia ter feito aquilo com ela, me refiro ao sexo mesmo, pois nem sequer falar ela falava, como eu disse ,a moça apenas babava e sorria.
Fiquei pensando como seria a vida de Esthela dali pra frente.
Não pensei muito, concluir que seria exatamente a mesma coisa. Ela iria continuar sorrindo e babando como sempre fez desde que nasceu.
Afinal, era isso que ela fazia da vida, sorrisos e saliva escorrendo pelo canto direito.
Nada mudaria.

Um comentário:

Isabela disse...

Ser ignorante é ser feliz :)