terça-feira, 9 de abril de 2013

Transa- Faixa numero 05




Escrevo hoje outra carta. Outra carta à minha velha senhora. Tão velha quanto distinta.Tão pura quanto imunda.
Escrevo hoje, nesta manha qualquer de abril, a minha renuncia. Escrevo aqui meu breve fim.
Nada mais poético, nada mais sublime do que suplicar de joelhos por aquilo que não se pode ter.
Venho hoje minha senhora, sem eira nem beira, apenas tinta e papel.
Sozinho.
Não sofro mais, não queimo cigarros quaisquer, não leio mais romances clássicos. Não me empolgo, como outrora me empolgava com moças felizes e coradas.
Não caio mais em pranto, não rasgo cetim.
Alimento agora um ódio sobrenatural por vinhos baratos, vinhos sem rolhas, sem datas de fabricação. Vinhos que desde sempre, repito minha cara, desde sempre, odiei. Mas que ela tanto insistirá por me ensinar a amar.
Ela quase que sem percebe, arrastava-me para outro mundo, por outro caminho. Porém, tenho eu agora no alto da idade, a total convicção de que ela sabia melhor do que qualquer outra mulher no mundo o que estava fazendo. Sabia de cor a trilha que abria em mim com seus lábios, suas pernas, sua língua morna, seu seios.
Galateia, esculpida por mim e feita mortal por si mesma.
Mas agora morta.
Não! Não se preocupe, não sujei minhas mãos de sangue. A morte foi sutil e banal, como todas as mortes relevantes são. Coisas de ordem rotineira, do dia a dia. Morre-se ao levantar da cama, ao atravessar a rua, ao falar alto. Morre-se por tudo.
Mas antes dela minha cara leitora, teve outra, outra e ainda mais uma (se teve a bondade de não me ter por um clássico faça-me o devido favor de não me ter por puritano). Ou achas mesmo que deixei te tomar vinhos baratos assim do nada?
Uma entre essas outras me ensinou os deleites do paladar (e nesse ponto da historia voltamos aos vinhos caros), a outra, os atalhos do corpo (cuja os quais já conhecia, mas sempre há o que se aprender em matéria de anatomia, não é verdade?) e a terceira nada quis me dar, nada falou, nada mostrou. Nem mesmo se despiu.
Mas tudo isso são coisas velhas, tão velhas quanto eu ou você que individualmente temos a idade dos livros em nossas estantes.
Já cá me doí os pulsos (são os tempos, sabes disso tão bem quanto eu), temo ter que parar minha redação por aqui, mas fique sabendo que com a terceira (isso mesmo, aquele que nem se quer se despiu de mim), foi com quem mais aprendi sobre o mundo. Mas isso minha velha amiga é assunto para uma outra carta.

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